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Audiências de Custódia: o remédio que virou veneno

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Foto: site Jusbrasil

A justificativa mais plausível para a implantação das chamadas “Audiências de Custódia” seria a de permitir que alguns dos atores responsáveis pela persecução penal mantivessem contato imediato com o acusado, com os policiais e com as provas testemunhais e materiais produzidas quando da prisão.

Desta forma, na presença de seu defensor, do Ministério Público e do Juiz, o preso poderia manifestar-se culpado ou inocente das acusações que lhe foram imputadas, ditando, a partir de então, o rito da instrução criminal.  Declarando-se culpado e colaborando com as investigações o preso receberia um tratamento mais célere e menos gravoso, reduzindo os esforços e gastos com a persecução penal. Declarando-se inocente, exigiria do Estado maior aprofundamento das investigações e investimentos na produção de provas para comprovação da materialidade e autoria do delito; em contrapartida perderia a oportunidade de usufruir dos benefícios e atenuantes oferecidos aos que resolvem colaborar.

Assim, com a perspectiva de “aceleração” da prestação jurisdicional (julgamento da ação penal) e efetiva aplicação da reprimenda, as Audiências de Custódia estariam atacando um dos maiores problemas enfrentados pelo Brasil na área de segurança pública: a impunidade. Como diria Rui Barbosa: “justiça tardia é injustiça manifesta”. E não se pode negar que essa demora incompreensível e injustificável nos julgamentos dos crimes é uma homenagem à impunidade e um desserviço a sociedade.

Todavia, esse “remédio” contra impunidade, que era aguardado com muita ansiedade, especialmente pelos que desenvolvem o serviço de polícia ostensiva e que se empenham e se arriscam para a realização das prisões em flagrante delito, foi prescrito com uma formula desvirtuada, que inverteu prioridades e desprezou ingredientes essenciais, se transformando num veneno mortal para motivação dos policiais.

Na verdade, da forma como estão sendo realizadas, as Audiências de Custódia ao invés de servirem como potencializadoras da instrução criminal, foram reduzidas à mera verificação da integridade física do preso e da necessidade ou não de manutenção de sua privação de liberdade; servindo apenas para questionar a legalidade e legitimidade da ação policial, retirando do agente público a presunção de idoneidade e colocando-o na condição de suspeito e, senão estimulando, ao menos favorecendo a multiplicação de acusações levianas e infundadas em desfavor dos policiais. Perquirir ao preso se foi ou está sendo vítima de violência ou abuso é procedimento basilar para garantia de seus direitos individuais. Todavia, tomar essa argumentação como verdadeira sem sequer ouvir os responsáveis pela prisão a esse respeito, como tem ocorrido frequentemente, é privilegiar o infrator e penalizar o agente público.

Sem desprezar ou minimizar a importância da defesa intransigente dos direitos humanos e da necessidade de apuração de todas as denúncias que envolvam falhas na prestação de serviços públicos, a realidade fática e incontestável é que, infelizmente, acusações dessa natureza são recebidas como “verdades sabidas”, invertendo automaticamente o ônus da prova e impondo ao agente a incomoda e injusta obrigação de provar sua inocência, afinal o senso comum nos afiança que policiais “são truculentos e autoritários” por natureza e “má formação”.

O impacto imediato da dinâmica estabelecida nas Audiências de Custódia é preocupante. A rejeição ao modelo adotado é patente e os reflexos no serviço policial, a médio e longo prazo, são incomensuráveis. Para se ter uma ideia do quão pernicioso se tornou esse mecanismo, bastaria dizer que apenas  511, dos  1349 presos encaminhados paras as audiências permaneceram encarcerados, os outros 838 foram colocados em liberdade, desconstruindo e desmerecendo o trabalho policial.

Não bastasse os prejuízos à atividade policial, favorecer o retorno ao convívio social de uma pessoa que cometeu um crime sem a devida aplicação de uma reprimenda justa e proporcional é uma homenagem à criminalidade, um estímulo à violência e um atentado contra o Estado Democrático de Direito, que fere de morte a ordem e a paz social.

Por fim, a dinâmica e os objetivos das Audiências de Custódia precisam ser revistos com urgência, especialmente para que possam funcionar como um instrumento de otimização do sistema de justiça criminal, dando maior celeridade ao seu processamento. Assim, a Audiência de Custódia serviria de remédio não só para defesa dos direitos humanos dos cidadãos que estão sendo presos; mas também estenderia seus efeitos benéficos para defesa do “cidadão e ser humano policial”, que se sacrificou para realizar seu trabalho com presteza e retidão; e para toda sociedade, que precisa contar com a certeza da escorreita aplicação das leis.

Anésio Barbosa da Cruz Júnior – Tenente CoronelTCoronel Anésio Barbosa

Vice-presidente da Associação dos Oficiais da PM e BM

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